Os cidadãos de Córdova viviam na cidade mais bonita do mundo e sentiam-se muito orgulhosos da Grande Mesquita, que fica situada no centro da cidade. Não só era uma mesquita maravilhosa, como também estava rodeada por jardins magníficos, cheios de laranjeiras perfumadas, fontes espumosas e flores de todas as cores. Os habitantes de Córdova costumavam sentar-se no jardim e pensar que estavam no Paraíso.
O único problema eram três jovens travessos: Rashid, que era muçulmano; Samuel, que era judeu; e Miguel, que era cristão.
Entravam e saíam das fontes; saltavam por cima dos canteiros; escondiam-se nos jardins e atiravam laranjas maduras a quem quer que vissem.
Os jardineiros, Ibrahim e Yacoub, tentavam apanhá-los, mas os três amigos eram demasiado rápidos para eles.
Um dia, os rapazes estavam a atirar laranjas às pessoas, à medida que estas saíam da mesquita. Uma laranja particularmente podre caiu aos pés de um homem ricamente vestido.
— Estamos em apuros! — exclamou Rashid. — É o califa em pessoa! — Fujamos!
Os três rapazes tentaram fugir, mas os soldados do califa apanharam-nos e levaram-nos à presença dele.
— Finalmente, foram apanhados pelos próprios soldados do califa! — alegrou-se o jardineiro Ibrahim.
Yacoub esfregou as mãos.
— Agora é que são elas! Vão apanhar dez chicotadas pelo menos!
O califa interrogou-os:
— Com que então, meninos, a atirarem laranjas ao vosso califa?
— Não sabíamos que éreis vós, Senhor — murmurou Rashid.
— Tendes feito isto com frequência? — perguntou o governante com severidade.
Os rapazes olharam para o chão com tristeza e acenaram com a cabeça.
— Todos os dias, saiba Vossa Magnificência — exclamaram os jardineiros. — Estes rapazes são a nossa desgraça.
— Bem — disse o califa, tentando não sorrir — vejo que tereis de ser severamente punidos. Condeno-vos a trabalharam nestes jardins todos os dias, durante três meses.
E os rapazes assim fizeram. Durante três meses, plantaram, arrancaram ervas daninhas, regaram as flores e apararam os arbustos dos jardins. Yacoub e Ibrahim fizeram-nos trabalhar sem descanso.
Depois do trabalho, os três amigos, cansados e cheios de calor, passeavam pela mesquita fresca.
— Nunca vi um edifício tão belo — sussurrou Miguel. — É muito mais grandioso do que a nossa igreja.
— Ou que a minha sinagoga — acrescentou Samuel. — Belo e maravilhoso, sem dúvida.
— A nossa mesquita é verdadeiramente a casa de Deus — alegrou-se Rashid.
À medida que foram crescendo, os três amigos deixaram de se ver com tanta frequência.
Rashid estudou Medicina e tornou-se um médico famoso.
Samuel viajou por toda a parte como mercador, negociando em especiarias e seda. Anotou todas as suas impressões de viagem num diário e escreveu poemas de rara beleza.
Miguel herdou a quinta do pai. Tornou-se um grande proprietário de terras e era conhecido pela sua bondade e pelas canções alegres que cantava.
O califa envelheceu e os seus inimigos começaram a atacar Córdova por todos os lados. Acabou por ser derrotado numa grande batalha pelo rei cristão Fernando.
Miguel, que era agora o homem mais importante de Córdova, foi saudar o novo rei.
— Don Miguel — exclamou o rei — levai-me à Grande Mesquita, da qual muito ouvi falar.
— Com prazer, Senhor — respondeu Miguel. — É fonte de orgulho e alegria para todos os habitantes de Córdova, tanto muçulmanos como judeus.
O rei contemplou a mesquita.
— É de facto magnífica — concordou.
Depois suspirou.
— Mas esta vai ser uma cidade cristã e vamos construir uma grande catedral neste lugar. A mesquita tem de ser derrubada.
Nessa mesma noite, Miguel convidou Samuel e Rashid para jantar.
— Meus caros amigos, tenho notícias péssimas. O rei planeia derrubar a nossa adorada mesquita.
— E os nossos jardins maravilhosos? — indagaram Samuel e Rashid.
— Também vão ser destruídos.
— O que podemos fazer? — perguntou Rashid, com a cabeça entre as mãos.
— Temos de falar os três com o rei e dizer-lhe quão preciosa é a mesquita para todos em Córdova.
No dia seguinte, os habitantes da cidade encheram a praça para ver o rei.
— Estou aqui — anunciou Miguel — em nome de todos os cristãos de Córdova, para pedir ao rei que poupe a nossa mesquita.
Todos aplaudiram.
— E eu estou aqui em nome de todos os judeus de Córdova — disse Samuel.
— É assim mesmo! — aplaudiu a multidão.
— E eu, senhor, falo em nome de todos os cidadãos muçulmanos. Poupai a nossa mesquita!
Todos aplaudiram ainda com mais força.
O rei comentou:
— Vejo que as três comunidades pedem o mesmo e que não terei aliados se derrubar a mesquita.
Depois de pensar por um momento, o rei anunciou:
— Construirei uma igreja numa pequena parte da mesquita, mas o resto do edifício e dos jardins ficarão a pertencer a todos os habitantes de Córdova.
Os aplausos da multidão encheram a praça.
E assim a Grande Mesquita foi poupada para que gerações futuras a admirassem e dela usufruíssem. Ainda hoje se mantém intacta, e tem milhões de visitantes por ano. Muitos se sentam nos seus jardins e desfrutam da sombra e do perfume das árvores. Alguns afirmam mesmo ter visto os fantasmas de três rapazes malandros a entrar e a sair das suas fontes.
Ann Jungman
The most magnificent mosque
London, Frances Lincoln, 2006
(Tradução e adaptação)