Aprumado no seu corcel, o Grande Guerreiro cavalgava a galope quando, de súbito, a neve começou a cair e a cobrir tudo com um espesso manto branco.
Nesse lugar longínquo e solitário, não via onde abrigar-se. Apenas a Gruta Escura poderia servir de abrigo seguro. De modo que o Grande Guerreiro desceu do cavalo, prendeu o animal e entrou imediatamente na Gruta.
Que enorme e escura era aquela caverna! Tão escura que, num primeiro instante, o Grande Guerreiro ficou cego por completo. Mas os seus olhos foram-se habituando à escuridão e viu-se então num lugar muito espaçoso. Apanhou uns quantos ramos secos e fez uma boa fogueira. Esfregando as mãos, sentiu-se então acariciado pelo lume. Afiou a espada uma e outra vez e chupou até às espinhas vários arenques secos.
A certa altura levantou-se e, ao deitar mais lenha para o lume, viu surgir, saída das rochas, uma sombra aterradora. Que tremendo susto apanhou! O Grande Guerreiro logo se pôs em guarda. Aquele que, até então, ganhara todos os combates, desembainhou a espada bem afiada e desafiou:
— Ó criatura imunda! Mostra-me o que vales!
Apertando os dentes, o Grande Guerreiro dispôs-se a enfrentar a sombra. Empunhou a espada e sentiu-se bem protegido pela sólida armadura. A sombra, contudo, tornou-se ainda mais aterradora. O Guerreiro lançou então um novo grito feroz:
— Maldita sejas!
E voltou a atacar. Que golpes de espada terríveis! Que sons e chispas saltavam quando o metal chocava contra as rochas! Por um instante, no rosto do Grande Guerreiro aflorou um sorriso. Estava seguro de que também iria ganhar esta batalha. E correu para o cavalo a toda a pressa. Tão depressa que, ao tropeçar num ramo seco, caiu de bruços e ficou estendido com a espada no ar.
Ao ver-se numa situação tão ridícula, aquele que nunca tinha perdido uma batalha vociferou:
— Vais ver, maldita inimiga!
E, com um pau comprido que apanhou da fogueira, começou a golpear para todos os lados sem dó nem piedade, distribuindo a torto e a direito temíveis chicotadas de fogo. Com tanto ímpeto e tanta raiva o fez que chegou até a despir e a atirar contra as rochas a armadura. Esta caiu ao chão e ficou a rolar sobre si mesma….
O Grande Guerreiro deu-se então por vencido. Sem cavalo, sem espada, sem armadura, sem nada, completamente nu, sem outra roupa a não ser a sua própria pele! Que grande amargura sentiu! Que enorme e terrível humilhação! A comer o pó do chão! Caminhou de joelhos ainda um bom bocado, dirigindo-se às apalpadelas para o exterior…Muito, muito a custo, a cabeça para baixo e as costas bem curvadas…
Até que se deparou com uma luz acolhedora e fresca. Quanta luz!
Um suave calor começou então a percorrer a pele nua do Grande Guerreiro. Ainda nada podia ver, só sentia… Mas quando, passados uns momentos, os seus olhos se habituaram à claridade, viu de novo aquela sombra, lá fora, a desafiá-lo.
— Mil raios e coriscos!
Olhou de novo para a sombra…mas, desta vez, acabou por exclamar:
— Oh, mas é a minha sombra! Não é mais do que a minha própria sombra!
Voltou para a caverna e disse:
— Que parvo sou! A lutar com a minha sombra!
E ali ficou, diante do lume, ao lado dela:
— Afinal, eu mesmo sou o meu maior inimigo! Que grande idiota!
E começou a mexer ora um pé ora uma mão, primeiro o pescoço, em seguida a cabeça…Como uma criança pequena.
E foi assim que, em vez de se pôr a caminho em busca de novas guerras, o Grande Guerreiro decidiu ficar ali, naquele lugar longínquo e solitário, na companhia da sua sombra, agora já não como adversária, mas antes como amiga e companheira.
E enquanto desatava o cavalo, os raios do sol começaram a derreter a neve e fizeram daquele espesso manto branco uma surpreendente lâmina leve e transparente….
Pello Añorga
El gran guerrero
Vigo: Faktoria K de Libros, 2007
(Tradução e adaptação)